10.16.2009


                   
                 "Violência gera violência"
Entrevista -
Por Vitor Castro
O músico Marcelo Yuka em seu estúdio. Foto: Observatório de EcosAs Olimpíadas de 2016 podem representar para o Rio de Janeiro uma mudança estrutural. Aprendendo com erros cometidos nos Jogos Pan-americanos de 2007, a grande festa do esporte mundial pode ser um marco também para a cidade. Para que os benefícios dos investimentos possam efetivar mudanças no Rio, não basta nos preocuparmos apenas com um legado esportivo, mas sim com um Legado Social. Isso é o que espera o músico e militante Marcelo Yuka, que conversou com o Observatório Notícias & Análises sobre esse e outros temas referentes ao Rio de Janeiro.
O que as Olimpíadas devem proporcionar para a cidade do Rio de Janeiro?
O esporte é importante e sediar as Olimpíadas é ótimo para aumentar a auto-estima do brasileiro. Eu confesso que fiquei emocionado quando o presidente Lula falou após a vitória da cidade do Rio. Eu torci para isso, acho que vai ser importante para a cidade, para o mundo ver como somos alegres e gentis. Mas temos que pensar em um legado que extrapole o legado esportivo. É injusto pensar apenas em obras, é preciso pensar em um Legado Social, que deixe coisas úteis para a cidade, que possam ser utilizadas antes, durante e após os Jogos. Temos que crescer como país não apenas ganhando medalhas, mas com educação de qualidade.
Qual o papel da sociedade na construção dos Jogos?
O que se tem feito no Rio de Janeiro, e meu medo é que isso se intensifique para a preparação para os Jogos Olímpicos, é esconder os nossos problemas ao invés de pensar em resolvê-los. O que vai ser feito, levantar um muro para esconder a Maré? Depois pinta de branco e fica bonito. Mas isso é maquiagem, não é disso que precisamos. Eu estou muito feliz com os Jogos no Rio, mas ao mesmo tempo, nós artistas temos que levantar certas discussões para a sociedade.
No campo da segurança pública, quais as ações do Estado devem ser implementadas para as Olimpíadas?
Meu medo é que a política de segurança pública intensifique as ações violentas que tem realizado em favelas do Rio de Janeiro, com o objetivo de garantir a segurança nos Jogos. Temos que diminuir a violência para combater a violência. O Caveirão (carro blindado da polícia) tem uma frase gravada que diz “vou roubar sua alma”, enquanto o chefe da polícia diz que a polícia está usando cada vez mais da inteligência. Isso é inteligente? Nossa política de segurança é agressiva e diversas entidades internacionais recriminam essa postura, mas parece que as autoridades daqui não aceitam que outras pessoas questionem suas ações. É lamentável que esse tipo de pensamento cresça como se fosse o mais certo a se seguir.
Sobre os painéis que a Prefeitura do Rio disse que vai instalar nas vias expressas da cidade, qual sua opinião?
É uma hipocrisia vergonhosa, beira à criminalidade. É claro que esses painéis não estão ali para proteger os moradores das favelas da poluição sonora, mas para isolar, esconder. Isso remete a campos de concentração. Um exemplo dessa lógica são os muros construídos no entorno de favelas no Rio com o argumento de que servem para a favela não atingir as reservas ambientais. No Santa Marta a favela diminuiu e está cercada com o muro. Como contraponto temos mansões em locais de reserva ambiental que não foram incomodadas pelo poder público.
As Olimpíadas tem que servir como instrumento de integração, e não para intensificar essa diferença. Nós temos que pensar em espaços de convivência, de socialização nas favelas. Não quero ver pessoas subindo as favelas de jipe para ver como ela é, mas elas devem subir para ver como nós somos, para escutar um samba, assistir a uma partida de futebol ou competições esportivos, como teve no Santa Marta de Dowhill ou assistir a uma Roda de Funk.
Nós que nos posicionamos contra diversas injustiças acabamos como estereótipo de que a gente reclama de tudo. Não é bem assim, eu bato palmas quando concordo, adoro esse país. Mas é que eu tive uma educação que me permitiu ver que a violência gera violência e deixa a população das áreas mais pobres em fogo cruzado.

Nenhum comentário: