MAURO FERREIRA
Foi com a voz e imagem intencionalmente distorcidas que Erasmo Carlos apareceu, através do telão, no palco da casa carioca Vivo Rio, onde estreou a turnê nacional de seu show Rock'n'Roll na noite de sexta-feira, 25 de setembro de 2009. Como se fosse um dependente químico, o Tremendão dá um depoimento hilário para no fim confessar que seu vício irrecuperável é o rock'n'roll, celebrado no álbum de inéditas lançado em maio. Por essa genial abertura, o espectador já intui que o show vai ser uma festa de arromba. E é mesmo. Jovial como o CD que o inspirou, o show Rock'n'Roll junta Erasmo a músicos da nova geração. Nada menos do que três integrantes da banda - Pedro Loppez (baixo), Luiz Loppez (guitarra) e Alan Fontenele (bateria) - são oriundos do grupo Filhos da Judith, atuante na cena indie carioca. Eles injetam sangue novo numa banda que destaca previsivelmente as guitarras, tocadas em alto e bom som por Luiz, Billy Brandão e pelo pré-histórico Dadi, momentaneamente fora do seu ofício de baixista. No bis, Erasmo ainda convocou Liminha, produtor do disco, para subir ao palco e encorpar a banda como guitarrista em Cover - número valorizado pela inusitada invasão do palco por sósias de ícones do rock e da cultura pop como Elvis Presley (1935 - 1977), Marylin Monroe (1926 - 1962) e Roberto Carlos - e em Festa de Arromba, que termina num duelo de guitarras que evoca o espírito do bom e velho rock'n'roll que ainda anima Erasmo. Dez!
Aos 68 anos, Erasmo Carlos poucas vezes soou tão jovem em cena. Há todo um cuidado no show - desde as projeções até as hilariantes tiradas cênicas da abertura e dos covers - que faz de Rock'n'Roll o melhor espetáculo apresentado pelo artista nos últimos 20 anos. É fato que algumas músicas do disco novo, caso de Jogo Sujo, não renderam tudo o que poderiam na estreia. Chuva Ácida - para citar mais um exemplo - também caiu sem impacto no roteiro. São números que certamente ficarão mais azeitados e ajustados quando o show for para a estrada com seu repertório que engloba (quase) todos os grandes sucessos da carreira do cantor. Na intenção de contentar o público, Erasmo tocou somente metade das 12 músicas do álbum Rock'n'Roll, ignorando petardos como Um Beijo É um Tiro, parceria sua com Nando Reis. Mas é justamente essa preocupação com a satisfação popular que faz com o que o show tenha um mágico clima de celebração. Tanto que, nos refrãos de Sentado à Beira do Caminho e É Preciso Saber Viver, o cantor direciona o microfone para a platéia para que o público cante com ele num coro forte e popular.
"Rock'n'Roll não é somente rebeldia e contestação. É amor também", ressalta Erasmo, quase se justificando por cantar Mulher e Minha Superstar, sucessos radiofônicos que deram novo impulso à sua carreira no início dos anos 80. Conceitos à parte, entre músicas novas e velhas, Erasmo fez a festa. Os efeitos dos teclados de José Lourenço deram outra pele ao Negro Gato em constraste com a placidez bossa-novista do número seguinte, Noturno Carioca, parceria de Erasmo com Nelson Motta. Mais tarde, o peso das guitarras encorpa o Panorama Ecológico - tema pioneiro na defesa das causas ambientais - e dá tom heavy a Quero que Vá Tudo para o Inferno, o avassalador sucesso de Roberto Carlos em 1965, atualmente renegado pelo Rei por manias e por convicções religiosas. Os ótimos arranjos valorizam e renovam as músicas. Rock'n'Roll reitera a certeza de que Uma Guitarra É uma Mulher é, aliás, uma das grandes faixas do CD homônimo do show. E de que os sucessos das velhas tardes de domingo - Lobo Mau, Minha Fama de Mau, Vem Quente que Eu Estou Fervendo - continuam jovens como esse tremendo roqueiro quase setentão que, sem pudores, continua devotado aos vícios de sua juventude.
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