8.26.2009

Barbara Heliodora: Aderbal Freire-Filho se sai bem do desafio de adaptar 'Moby Dick'


Barbara Heliodora

RIO - Após outras experiências com a encenação de obras literárias narrativas sem o uso de adaptações para a forma dramática, Aderbel Freire-Filho enfrenta agora a desafiadora encenação de "Moby Dick", de Herman Melville, em uma nova forma que faz uso frequente da literal leitura do texto. A obra de Melville, mais do que consagrada, é a concretização de uma monumental tarefa de expressar o constante e grandioso conflito entre o obcecado baleeiro Capitão Ahab, que sacrifica não só a própria vida como a de seu barco, o Pequod, e de boa parte de sua tripulação na alucinada busca de Moby Dick, a baleia branca que um dia lhe arrancara uma perna. A obra de Melville é extraordinária pela arte com que é feito o uso da palavra para expressar, a um só tempo, a imensa ação física da busca e a dimensão do delírio mental e por vezes espiritual de Ahab.
O que Aderbal faz é tentar reverter esse processo, tornando ação viva o que Melville descreve - naturalmente preservando o que é dialogado como parte da ação - mas recorrendo à forma original, com as várias leituras de trechos da obra, já que seria impossível encenar toda a sua monumentalidade. Esse recurso híbrido, elaborado com cuidado, não chega a ser totalmente bem-sucedido, não só pela dimensão da obra original mas também porque o crescendo da tensão é tão bem realizado como obra literária que nem sempre o espetáculo consegue encontrar o seu equivalente.
" A encenação tem aspectos impecáveis "

A encenação tem aspectos impecáveis:

o cenário de Fernando Mello da Costa e Rostand Albuquerque é precioso, um quadrilátero que representa o deque do Pequod, rico em detalhes de equipamento tanto para navegação quanto para a pesca, enquanto os figurinos de Kika Lopes são adequados porém bem menos evocativos do que o cenário. As músicas e a direção musical de Tato Taborda fazem modesta contribuição, sem alcançar qualquer autenticidade no espírito da tripulação, mas a iluminação de Maneco Quinderé é irretocável, com manhãs, noites, tempestades e climas emocionais dando ao todo a vida que o cenário pede.
A direção de Aderbal Freire-Filho corresponde sem dúvida a seu entusiasmo pelo texto, mas se perde um pouco em agitações e gritarias desde o início, o que prejudica a progressiva intensificação da narrativa épica.
Chico Diaz é um Capitão Ahab um pouco nervoso demais, o que deixa sua figura menos forte do que aparece em Melville, mas, dada essa linha, faz um bom trabalho. Isio Ghelman (Starbuck), Orã Figueiredo (Stubb) e André Mattos (Flask) se empenham com entusiasmo, porém o uso constante de gritos os torna por vezes igualmente monocórdios, e os recursos para que os quatro atores façam vários papéis são um pouco simples demais, mesmo que a intenção acabe transparecendo.
Tentar encenar "Moby Dick" é tarefa de tal monta que as ressalvas são feitas a partir de uma qualidade considerável na realização em cartaz no Teatro Poeira.

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'Moby Dick'.
Teatro Poeira: Rua São João Batista 104, Botafogo. Tel: 2537-8053. Qui a sáb, às 21h. Dom, às 19h. R$ 40 (qui e sex) e R$ 50 (sáb e dom). 130 minutos. Até 23 de novembro

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