Villas Bôas Corrêa
A impressão, a cada dia mais nítida, de que o presidente Lula intimida os amigos, não gosta de críticas e escancara o riso solto com os elogios, salta da ampla cobertura política do escândalo do Senado, com repique na Câmara e o impacto das fotos às gargalhada, o abraço ao risonho senador Fernando Collor ou recostado na cadeira, de paletó aberto, ao lado do sisudo senador Renan Calheiros, que passa a impressão de constrangimento com a efusão do recente aliado.
Com a mania de distribuir conselhos a quem não pediu e no tom de iluminado que sabe tudo, Lula passou da conta e esbarra no exagero. Na entrevista à Rádio Globo, diante da atração irresistível dos microfones, Lula falou como profeta diante da platéia invisível. E o mestre-escola ensinou aos alunos do primeiro ano primário, as noções elementares sobre o que lhe veio à cabeça. As eternas verdades rejuvenescem nas lições da fluência presidencial: “Uma coisa é você matar, outra coisa é você roubar, outra coisa é você pedir um emprego, outra é a relação de influências, outra coisa é o lobby”. Para o retardado que não entendeu a preleção, o reforço explicitou que “nem todos os crimes são para a pena de morte, é preciso saber o tamanho do crime.”
Todo este relambório para encaminhar a defesa do presidente José Sarney, que teve gravada uma conversa telefônica com o filho Fernando Sarney sobre a urgência de um emprego no Senado para o namorado da neta. O namorado já está nomeado, empossado, trabalhando e recebendo os vencimentos, sob o fogo cerrado da oposição.
Lula não recua da solidariedade ao aliado: “O Sarney pediu para a Fundação Getúlio Vargas fazer uma nova estruturação para o Senado; o Sarney pediu que a Polícia Federal investigasse a questão do emprego para o seu neto.” E, na mesma linha, foi mais longe ao reafirmar que Sarney não deve renunciar sob pressão a presidência do Senado: “Não posso entender que cada pessoa que tem uma denúncia tem que renunciar ao seu cargo.”
Mexer em caixa de marimbondos sempre rende ferroadas que doem e incham.Num dia que esbanjou generosidade, Lula tirou da cova o escândalo do caixa dois do PT, que coletou milhões para a eleição de candidatos do partido. E que seria secundado pelo mensalão, para a recompensa aos que aderissem à base parlamentar do governo. A pesquisa relembrou a sentença de discutível moralidade: “O que o PT fez, do ponto de vista eleitoral, é o que é feito no Brasil sistematicamente”. Neste ponto, tem toda a razão. As fraudes eleitorais mais grosseiras elegeram mais senadores, deputados federais e estaduais, prefeitos e ate governadores do que as muambas do caixa dois.
Fui convocado à revelia para mesário na apuração dos votos da eleição de Getúlio Vargas, em 1950, para o mandato da desforra com a derrota do candidato do presidente Dutra e que, com a posse em 31 de janeiro de 1951, terminaria com o suicídio em 24 de agosto de l954. As cédulas eram impressas pelos partidos e candidatos em todos os formatos e tamanhos, com um irresistível convite à fraude: da violação de urnas as trampas da apuração, da contagem dos pacotes de cédulas e em todo o processo lento e tedioso.
Os candidatos que se despediam das esperanças do mandato, abandonavam a apuração, dissolvendo o esquema de controle de votos. Do meio para o fim, na estafa da madrugada, as mágicas no mapeamento, transferindo votos dos que bateram em retirada para os que precisavam desesperadamente de alguns votinhos para o desempate com o concorrente elegeram dezenas, centenas, talvez milhares de candidatos pelo interior do Brasil dominado pelos coronéis de araque.
Mas, os coronéis seriam superados nos 21 anos da ditadura militar do rodízio dos cinco generais-presidente. Nunca se fraudou tanto na marra, às escancaras, o processo eleitoral e a democracia com os recessos do Congresso, os atos adicionais, com destaque para o AI-5, a punga do mandato do vice-presidente Pedro Aleixo para a ocupação do governo pela Junta Militar, das prisões, torturas, mortes nas masmorras dos Doi-Codi.
Daí para cá, a ilusão da eleição indireta pelo Colégio Eleitoral do presidente Tancredo Neves, que não chegou a tomar posse; do governo do vice José Sarney, que tomou posse para cinco anos de mandato e a rotina da esperanças e frustrações com a eleição de Fernando Collor de Mello, que renunciou para não ser cassado, o correto e honrado governo do vice Itamar Franco, os dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso e os dois mandatos de Lula da Silva, que terminam em 31 de dezembro de 2015, reacenderam esperanças que duraram pouco. E hoje arriscam a última ficha a reforma política.
Se ela não morrer na praia. Na forma do costume.
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